Design Sustentável

Texto de Alice Buratto

20160525_133841000_iOS

Pensar em economia criativa para se alcançar um desenvolvimento sustentável é necessariamente desenvolver empreendimentos economicamente viáveis, socialmente justos e ambientalmente corretos. Desse modo, apresenta-se os três pilares da sustentabilidade: o social, o econômico e o ambiental, os quais unidos representam um modelo de desenvolvimento que visa o bem estar do planeta e da sociedade.

Entende-se como socialmente correto um empreendimento  que contribua para a construção de uma sociedade mais equilibrada e o qual diminua as diferenças sociais, havendo uma inclusão das pessoas marginalizadas. Já por economicamente viável tem-se por uma gestão responsável e eficaz dos recursos. Finalmente, ambientalmente correto seria aquele empreendimento que use de forma racional os recursos naturais, priorizando a utilização das energias renováveis, o uso de matérias-primas biodegradáveis, reutilizáveis  e de fácil reciclagem e sem contaminação do meio ambiente.

Desse modo para se empreender dessa maneira faz-se necessário que o empreendedor identifique um desequilíbrio que cause uma exclusão, um sofrimento social, ou uma degradação ambiental; e a partir desta reconheça a oportunidade de atuar nessa ordem vigente, desenvolvendo um projeto para modifica-la, o qual atuará em tal situação e acarretará um novo equilíbrio, agregando valores onde não existia e gerando um desenvolvimento. O empreendedor necessita ter um pensamento inovador e atuar em áreas ainda desconhecidas ou novas, para dar outras respostas e soluções a problemas antigos; antes de mais nada, o empreendedor necessita reconhecer a oportunidade de atuação e acreditar em sua ideia.

Atualmente, a criatividade é tida como uma maneira de agregar valor, diferenciando-se a partir de características intangíveis, características as quais não podem ser transferidas ou copiadas, já que vivemos em um momento em que através da tecnologia tudo se transfere e tudo se copia rapidamente, contudo não o caráter emocional: “Lo que la tecnología todavía no consigue sustituir es la capacidad de crear, las emociones, la cultura, la visión” (HASHIMOTO, in ASSUMPÇÃO). Assim, em meio a esse contexto, tem-se como principal fonte de riqueza a idéa.

A criatividade é um bem imaterial por isso pode ser transmitida e compartilhada de forma gigantesca através das redes de conexão virtual, possibilitando um acesso ao conhecimento proporcionando um desenvolvimento o qual não implica em crescimento. Uma economia baseada na criatividade é inovadora e sustentável; reconhecendo a criatividade como possibilidade de novos modelos de negócios e de reinvenção de modelo econômico de um país, no qual se agrega valor a partir da criatividade da população.

emporio-beraldin-tecidos-moveis-com-toque-artesanal

O DESIGN SUSTÉTÁVEL DO BAKA STUDIO

Desse modo, tendo como princípio a sustentabilidade o Baka Studio é um studio de design e de curadoria o qual percorre diferentes países ao redor do mundo em busca de criatividade, sempre visando o desenvolvimento local e o consumo consciente de matéria-prima, apoioando o re-uso de materiais. Temos como exemplo a liha Industrial Trend, a qual reaproveita materiais encontrados em demolições. Além disso, dá-se como muito importante para nosso estudio o aproveitamento total da matéria, assume, em nossa linha Afrikan Skin, compomos diversos objetos a partir de partes animais que são normalmente descardas. Na África do Sul e Namibia, o consumo da carne de springbok e de zebra é comum e tradicional, dessa maneira há uma gama de peles, chifres e ossos, com os quais podemos criar produtos irreverentes e ecologicamente corretos. 

Junto a isso, nós apoioamos a produção local para que se possa haver um desenvolvimento social e economico da região. Assim, procuramos eximios artesões ao redor mundo, além de produzirmos nossos produtos manualmente em diversas regiões do mundo, pela população local de acordo com a região da matéria prima.

Nossa produção de bolsas e almofadas na Africa do Sul

Novos caminhos para urbanização na Cidade do Cabo após 21 anos de término do Apartheid

Texto de Alice Buratto

A África do Sul desde o princípio foi caracterizada como um território de conflitos e diferenças socioculturais. Antes da chegada dos brancos em terras africanas já se haviam conflitos entre os povos Zulu, Bantus e Xhosas. Contudo o aumento da comunidade holandesa da região da Cidade do Cabo no século XVIII acirrou esse conflito territorial, não sendo caracterizado como conflito apenas entre os negros mas incluindo também os ingleses e os holandeses que ali estavam. Após uma longa guerra travada entre o reino Zulu e os brancos no século XVIII levou a dominação de toda a área da atual África do Sul pelos ingleses, já havendo desde então a separação entre os territórios de diferentes domínios culturais.

Contudo, a crescente industrialização do pais e a necessidade de mão-de-obra acarretou  a êxodo rural e a aglomeração populacional nas cidades, criando grandes aglomerados urbanos multiculturais e raciais. Em 1948 o regime de apartheid fora instaurado, na qual segregava e separa a população sul-africana. Além de uma politica de segregação racial e social o apartheid era também uma politica de separação territorial, a qual expulsava dos centros urbanos todos aqueles que não eram brancos. Com o apartheid vieram politicas urbanísticas e obras de infraestrutura, as quais destruíram ou deram novos usos aos bairros das comunidades asiáticas, colloured e negras, as áreas centrais eram fechadas para o uso dos brancos e em volta das cidades foram construídas precárias microcidades (townsship) gradeadas destinadas a cada grupo cultural.

Após 46 anos, com o fim do apartheid em 1994, a África do Sul começa abrir suas cidades e reconstruir sua historia, tendo como patrimônio cultural a historia de segregação ocorrida nos anos anteriores. Assim politicas afirmativas não eram apenas medidas sociais mas também medidas culturais e territoriais para afirmação da maioria da população do país que fora brutalmente denegrida.

OS MUSEUS EM MEMÓRIA AOS TEMPOS DE SEGREGAÇÃO:

Em memória aos heróis libertadores e à população segregada foram construídos inúmeros museus situados em diferentes cidades sul-africanas para contar a historia do apartheid. Na mesma lógica dos museus universais, mas em âmbito nacional, tais museus funcionam como referencia e conectores da historia sul-africana. Nas palavras de Luiz Antonio Bolcato Custódio: “a estas unidades [museus universais] caberia a qualificação de pólos, funcionando como elementos isolados de concentração e irradiação – como atratores – na linguagem do planejamento.”

Contudo, na África do Sul, diferentemente do que acontece com o Guggenheim, esses museus não são de uma mesma rede administradora, e sim são museus independentes que convergem em sua temática e intercambiam informações, como se fossem polos conectores da historia do apartheid. Tendo a Cidade do Cabo, como foco de análise, pode-se citar dois museus que integram esse rede de conexão. O primeiro deles, e o mais famoso da cidade é o museu da Robben Island.

Numa tendência de um novo urbanismo, não mais segregacional, mas um que inclua os espaços degradados, em que planejamento urbano utiliza-se da cultura e da criatividade para revitalizar espaços públicos, a antiga prisão localizada na ilha Robben Island, na qual foram clausurados os presos políticos da época do apartheid, foi tida como um artificio, uma oportunidade, uma potencialidade, através de sua revitalização e reciclagem, para a realização de um projeto que contribuísse para o desenvolvimento econômico, cultural e social da região. Junto a um projeto de revitalização maior da área portuária o qual será abordado mais para frente, a antiga prisão foi convertida em ponto turístico, no qual pode-se visitar a antiga cela de Nelson Mandela e vivenciar um pouco da experiência da prisão. A visita à ilha faz parte da visitação do museu de mesmo nome, o qual não apenas apresenta uma exposição sobre a prisão e a estada de Nelson Mandela na mesma, mas como também uma coleção sobre a historia do apartheid, conectando-se assim aos outros museus sul-africanos em memoria aos tempos de segregação.

Esse complexo da Robben Island, representa um dos principais pontos turísticos da Cidade do Cabo, onde o visitante pode percorrer o museu, realizar um passeio de barco até a ilha e visitar a antiga prisão, contudo ele é um ponto turística viabilizado pelo seu potencial cultural e histórico associado a um planejamento estratégico. Segundo Luis antonio Bolcato Custodio:

El Turismo cultural, entendido como actividad socio-económica basada en las distintas formas y manifestaciones culturales, es una de las principales alternativas contemporáneas para el desarrollo económico de comunidades y se presenta, cada vez más, como salida para la preservación del patrimonio y de la cultura. (CUSTODIO, sem data)

Outro museu importante a ser citado que pertence a essa rede de conexões é o District Six Museum, o qual conta a história do bairro Distrito 6. Bairro que além de ter sido palco  da expulsão da comunidade islâmica não branca, dos indianos e da comunidade Xhosa, fora também destruído (havendo a demolição das casas dos comércios e dos parques, algo que ainda hoje é perceptível em sua vastidão) para dar espaço a uma nova obra urbanística da época do apartheid a qual nunca fora construída. Assim após o regime, em meio a tendência de um novo urbanismo de revitalizar espaços degradados e cicatrizar a imensa ferida do apartheid, o bairro passou por um processo de revitalização no qual um museu em sua memória, de seus moradores e aos anos de segregação fora construído. Contudo essa intervenção no bairro deu-se de forma muito singela, e a vastidão da demolição ainda perpetua, apesar do planejamento e investimento no local, o qual reconstituiu o mesmo como área residencial e agregou alguns estabelecimentos comerciais e culturais além do museu.

PLANEJAMENTO URBANO E A OPORTUNIDADE DA COPA DO MUNDO DE 2010:

Numa esfera de um novo planejamento urbano e de cidades criativas, a valorização do espaço público vem como meio de recuperar as identidades históricas e inserir a cidade num novo modelo de urbano, no qual os valores de sociabilidade, sustentabilidade e qualidade de vida são clamados. Em um mundo cada vez mais globalizado, e em uma cidade inserida em diferentes contextos culturais o espaço publico volta-se ao encontro de pessoas e culturas diversas. Sendo assim, dentro do tradicional tecido urbano das cidades, se há a necessidade de se criar novos lugares a partir de áreas esquecidas, abandonadas ou desvalorizadas como os centros históricos e as zonas portuárias (Dias, 2004).

É em meio dessa tônica que se apresenta o projeto Victoria & Alfred Waterfront Company, primeiramente apresentado em 1988 e revitalizado em ocasião da Copa do Mundo de 2010. A&V Waterfront, como é conhecido, constitui-se como um pólo de atividades mistas, sendo um centro comercial, cultural e residencial. Nele encontra-se condomínios residenciais e prédios hoteleiros, shoppings, restaurantes, museus apresentações de musicas, danças e artefatos de cultura nativa e também feiras gastronômicas. O Waterfront posiciona-se politicamente voltado ao turismo, ao sintetizar aquilo que se tem como característicos da cultura africana, tanto quanto dança, música, comida e artefato, e transformar isto em produto o qual é consumido pelo turista. Contudo é um centro não apenas para turistas em busca do imaginário do exótico africano como também para capetowne em busca do lazer e do consumo.

Dessa maneira, por todas as características que constitui o projeto do Waterfront, pode-se definir o mesmo como uma operação estrela, a qual, segundo Custódio, é:

Programas e projetos articulados, integrando interesses de diferentes naturezas, envolvendo parcerias públicas e privadas, vinculados por links em pólos, núcleos ou redes, em busca de objetivos comuns (…).Típicos empreendimentos consorciados que avaliam potencialidades, somam oportunidades e buscam implementar alternativas para a estruturação, recuperação ou desenvolvimento de cidades, setores, regiões ou países. (CUSTÓDIO, sem data)

Junto a isso, de acordo com Custódio, grandes eventos mundiais, como Olimpíadas e Copa do mundo, são vistos como oportunidade para o desenvolvimento de projetos de infraestrutura urbana:

Ejemplos más recientes demuestran que el planeamiento estratégico de estos emprendimientos, involucrando esfuerzos públicos y privados, pueden representar grandes aportes externos a las ciudades, con casos de mayor o menor suceso. Entre ellos están los parques olímpicos de Pequín y de Barcelona; las Expos de Lisboa, Sevilla y Shangai. Entre las Copas del mundo de fútbol, la de Berlín y de África del Sur, con significativas transformaciones en infraestructura, equipamientos urbanos o cohesión social. En todos estos casos, para la gestión y consecución de proyectos y obras fueron creadas asociaciones o corporaciones publico-privadas específicas. (CUSTÓDIO, sem data)

Não sendo diferente, com a realização da Copa do Mundo em 2010, o governo sul-africano investiu bastante em infraestrutura das cidades que sediaram e revitalizou  zonas portuárias e de interesses turísticos como centros históricos. Na Cidade do Cabo, além da revitalização da marina já citada, foi construído o moderno estádio de Greenpoint, no qual, após a Copa, além de abrigar eventos esportivos ocorrem também programações culturais, como grandes concertos musicais. A construção do estádio acarretou um desenvolvimento cultural e econômico da área, o qual não durou apenas ao longo do evento mundial, transformando a região permanentemente.

ÁREAS DE ALTO INTERESSE CULTURAL:

Junto a isso, a Cidade do Cabo, constitui-se como um pólo do designer e de atividades culturais, concentrando-se inúmeros serviços e atores relacionados a essa área. Em uma conexão entre iniciativa privada e poder público, muitos festivais são realizados nas ruas da cidade, eventos os quais ativam os espaços públicos, tal como praças e ruas, tornando-os em espaços de convivência e sociabilidade. Além dos festivais, tal como o de Jazz e o de Arte Contemporânea, a Cidade do Cabo é famosa por seus mercados de ruas e feiras que unem gastronomia Gourmet, arte, artesanato e designer.

Tendo as cidades criativas em foco, um dos temas contemporâneos que tem a cultura como fator de desenvolvimento econômico são os distritos culturais. Grosso modo, falar de distrito cultural é pensar numa estruturação baseada na união entre cultura, economia e sociedade, a qual busca ressaltar as características artísticas, sociais e culturais de uma região especifica (Custódio, Lazzeretti).

Contudo, segundo a autora Luciana Lazzeretti, falar em distrito cultural esbarra em inúmeras definições, que ajudam a entender o modelo teórico do conceito como metodologia de análise cerca de patrimônio artístico, cultural e ambiental. (CAEH) A ideia de localidades, zonas ou/e aglomerações de recursos culturais se faz de grande valia (HCLS – sistema local de alto interesse cultural) o qual se caracteriza:

(…)por la presencia, dentro de su territorio, de una dotación amplia de un conjunto de recursos artísticos, naturales y culturales, que lo caracterizan como un lugar de alto interés cultural (HC Places, o lugares HC), y de una red de trabajo de actores económicos, no económicos e institucionales que llevan a cabo una serie de actividades relacionadas con la conserva- ción, mejora y dirección económica de estos recursos, y que representa en su totalidad una ciudad con un cluster de alto interés cultural (HC cluster)» (LAZZARETTI, 2003, p. 638).

Junto a esse conceito, para se pensar a formação de um distrito cultural, Lazzeretti utiliza do conceito de cluster (agrupamento, aglomeração) que seria uma aglomeração de atores, agentes sociais, ou recursos os quais ativam os processos para a formação de un distrito cultural, desenvolvendo uma melhora econômica dos recursos, ou seja uma rede de trabalho e de relações de atores e recursos, contudo nao havendo uma localizaçãoo territorial especifica, já a definição de lugares de alto nível cultural (HC) seriam aqueles lugares em que “un conjunto de actores económicos, no económicos e institucionales deciden utilizar algunos de los recursos idiosincrásicos compartidos con objeto de desarrollar un proyecto común, que es simultáneamente un proyecto económico y un proyecto de vida” (Lazzaretti, 2006).

Dessa maneira tendo essas definições esclarecidas, pode considerar que a Cidade do cabo tem dois distritos culturais muito bem definidos e localizados e alguns clusters de agentes e recursos. O primeiro distrito cultural da Cidade do Cabo é localizado no bairro de Woodstock, caracterizado pelo seu potencial artístico, vinculado a uma cultura de arte urbana, o bairro passou por um processo de recuperação e revitalização em uma iniciativa publico privada, a qual desenvolveu um processo de desenvolvimento econômico, cultural e social, articulando diversos grupos de agentes e recursos, transformando o bairro que já era potencialmente artístico (por apresentar aglomerações de artistas urbanos e intervenções) um pólo criativo da cidade: um distrito trendy hip, onde há um agrupamento de galerias de arte e de designer, ateliês de artistas, espaços de comercialização e para atender o crescente numero de visitantes um aumento do numero de cafés e restaurantes , os quais também proporcionam eventos culturais como performance. Junto a isso, o bairro abriga o mais antigo e famoso mercado de arte e gastronomia da cidade: The Old Biscuit Mill Market. este mercado é situado num complexo de casas antigas as quais foram restauradas para abrigar um conjunto de lojas tidas como alternativas, as quais comercializam das mais variadas coisas, desde objetos de decoração e peças de designer à móveis de demolição, fotografias, bijuterias vinhos entre outros. Além das lojas aos domingos acontecem uma feira gastronômica, banda ou DJ no jardim e stands de expositores com variados artigos. Esse mercado é frequentado por um publico variado, possibilitando uma mistura entre jovens, idosos, residentes e turistas, contudo sua capacidade conexão é limitada no quesito classe social e não consegue atingir um público de renda inferior, esbarrando num limitador histórico, econômico e social.

Sendo assim, apresenta-se o clusters de mercados populares de arte e gastronomia pelos quais a cidade é famosa. São entre eles mais de 10, os quais reúnem além dos produtores e fornecedores de matérias primas, artistas, artesões, designers, chefs em uma espécie de rede de mercados itinerantes pela cidade. Outro aglomeração que se tem como ícone da cidade é a do Jazz. Cluster que se reúne em torno de músicos, produtores, casas de shows, bares, restaurantes, instituições publicas de apoio a cultura em ocasião do festival anual de Jazz da cidade.

Além dos exemplos citados, não se pode esquecer do distrito do Gardens, o qual se assemelha muito a um distrito cultural. Bairro que tem suas atividade em torno a um parque o qual abriga um complexo com quatro museus e duas biblioteca, todos de iniciativa pública, em conjunto com algumas galerias de arte e artesanato. Pelo seu potencial cultural atrai grande numero de turistas, constituindo-se consequentemente no bairro uma estrutura hoteleira e de serviços para atender a demanda dos turistas.

CONCLUSÃO:

Apesar de, principalmente, após o fim do apartheid o governo da África do Sul, no caso estudado a Cidade do Cabo, investir em obras de planejamento urbano as quais envolvem empreendimentos tanto de iniciativas publico e privada ou em conjunto, que visam o desenvolvimento cultural, social, econômico e uma maior integração da cidade, a qual possa ser reabitada e revivida pela sua população inicial; a Cidade do Cabo ainda é uma cidade marcada pelas diferenças e segregação. Mesmo após as obras de planejamento urbano, as townsships ainda existem e são as principais regiões de moradia da população negra, a qual acessa a cidade principalmente para o trabalho e com muita dificuldade de transporte, já que o transporte público não atende a totalidade da cidade, nem muito menos chega à periferia.

A inclusão ainda é algo delicado e esbarra em um processo histórico de exclusão construídos ao longo de anos e acentuado com o regime do apartheid. Mesmo com o fim da ditadura segregacionista branca, a Cidade do Cabo ainda hoje, após 21, é uma cidade dividida, mantendo suas inúmeras townships ao seu redor da cidade, inclusão e exclusão vivem lado-a-lado, avanço, tecnologia e grandes obras arquitetônicas e culturais esbarram na falta de saneamento básico das áreas periféricas. Enquanto os incluídos, em sua maioria brancos, utilizam-se do avanços de infraestrutura, os quais amenizam a historia da segregação, a maioria da população ainda continua excluída; todos pertencentes a uma miscelânea cultural composta por brancos, negros, afrikaners, xhosas, zulus, indianos e mulçumanos, em meio à políticas afirmativas que causam reboliço em muitos da população.

Dessa forma, a Cidade do Cabo apesar de apresentar muitas características de uma cidade criativa, desenvolvendo projetos de desenvolvimento cultural, econômico e social, ela ainda apresenta um grande desafio, o qual pode ser entendido como uma meta sul-africana no geral: o fim da segregação racial e social. Fato que foi construído historicamente e qual poderá ser desconstruídos a partir de políticas afirmativas na esfera social, econômica, politica, cultural e territorial, e de uma união entre estado e iniciativa privada a qual pode priorizar aspectos de uma economia criativa e sustentável como perspectiva de desenvolvimento, assim como vem ocorrendo na cidade.

 

 

BIBLIOGRAFIA

 

FONSECA, Ana Carla. Industrias criativas e economia criativa como estratégia e desenvolvimento. In: Curso de pós-graduação em gestão de cidade e economia criativa.

CUSTUDIO, Luiz Antônio Bolcato. Cultura, criatividade e urbanismo. In: Curso de pós-graduação em gestão de cidade e economia criativa.

__. Operação Estrela. Sem informações.

DIAS, Fabiano. O desafio do espaço público nas cidades do século XXI. Fúrum Mundial de Barcelona. Espanha. 2004

DISTRICT SIX MESEUN. Sem título. In. WWW.districtsixmuseun.com.za . acessado em 29/10/2014.

GLUCKMAN, Max. Análise de uma situação social na Zululândia moderna. In: FELDMAN-BIANCO, B. (Org.). Antropologia das Sociedades Contemporâneas: Métodos (segunda edição revisada e ampliada). 2o. ed. São Paulo: Editora Unesp, 2009.

LAZZERETTI, Luciana. El distito cultural. In Mediterrâneo Econômico.

 

Moradia Coletiva

Por: Maria Silvia Ferraz

Revista Bamboo 06.2016

 

 

depois do co-working, começam a surgir iniciativas de co-living

 

Compartilhamento é um conceito em alta na vida contemporânea urbana. Diante da falta de espaço físico, preocupação com sustentabilidade e desejo por uma existência mais inteligente, compartilhar escritório, carro ou casa de veraneio já é uma realidade para muitas pessoas. Porém, em Londres, uma incorporadora está expandindo o conceito para a moradia – e com sucesso. Quatro novos empreendimentos residenciais propõem o co-living; uma evolução do co-working, agora abrangendo todas as atividades humanas. Pode-se comparar com o esquema de uma república estudantil, porém numa versão mais profissional, mais confortável e sem foco num público necessariamente tão jovem.

Kitchen - ARTICLE 2

Os espaços comuns de uma casa, como cozinha, salas e áreas de serviço, são compartilhados. Já quartos e banheiros são individuais. Dessa forma, a privacidade do residente é preservada, ao mesmo tempo em que os custos do aluguel diminuem exponencialmente. Além disso, os empreendimentos garantem boas áreas dedicadas ao lazer, como lounges, salas de jogos e academias. A casa se propõe a ser lugar de inspiração e convivência, promovendo a troca de ideias, histórias e culturas entre seus moradores.A iniciativa vem ganhando força em Londres. Recém-inaugurado, o complexo habitacional Old Oak, da The Collective, está retratado nas fotos.

Studio-1 - ARYICLE 2

A empresa oferece um programa completo para seus inquilinos. Além de restaurante, terraço, spa e cinema, conta com um anexo de escritórios no modelo de co-working. Internet, limpeza e segurança são garantidos, trazendo tranquilidade aos moradores.

quarto

Jovens solteiros são, naturalmente, o público alvo. A ideia é atrair aqueles que acabaram de ingressar na vida profissional. Mais do que isso, o sucesso de procura ao empreendimento revela interessantes tendências de habitação. Se no passado comprar um imóvel e atingir estabilidade eram metas, hoje se valoriza muito mais a liberdade de locar quartos por semana e poder sair a qualquer momento para desbravar o mundo. Indícios das mutações pelas quais vêm passando o morar.

 

thecollective.co.uk

Arquitetura: arte para as massas

Por: Guilherme Winisk

Revista Bamboo 04.2015

 

Sabe-se que uma diferença crucial entre a arte da construção (arquitetura) e as artes visuais é o caráter essencialmente público da primeira. Pois diferentemente da pintura e da escultura, que surgiram historicamente associadas ao valor do culto, e não ao laico valor de exposição como atualmente, a arquitetura sempre esteve vinculada a uma necessidade prática: abrigar os homens. E mesmo quando as artes plásticas passaram a existir segundo um valor de exposição na sociedade, elas permaneceram, até muito recentemente, encerradas em coleções privadas, e portanto distantes de um acesso público mais efetivo. Já os edifícios ao contrário, materializam com sua exterioridade física a face pública do lugar no qual se implantam, que é muitas vezes urbano. E, nesse contexto, materializam também as funções sociais que representam: culto religioso, administração política, serviços médicos e educacionais, moradia etc. Quer dizer que, se a obra de arte está em princípio voltada para contemplação estética do individuo solitário, a arquitetura está voltada para a apreensão coletiva e distraída das massas através do uso.

 

Mas nada impede que o espaço da arquitetura, que por ser o ambiente da nossa vida nos propõe uma forma de apreensão distraída dada pelo uso rotineiro, seja percebido também por um ato de contemplação estética distanciada. A principal dificuldade filosófica para compreender o objeto da arquitetura resulta da confusão entre a mais corrente percepção cotidiana do edifício pelo usuário, e a mais especializada percepção estética pelo contemplador. Uma dicotomia na qual o vazio dos espaços interiores de um edifício aparece associado à utilidade, já que o adentramos e o percorremos, enquanto a presença superficial do volume, isto é, sua fachada, é normalmente objeto de contemplação estética distanciada.

É exatamente neste ponto que incide a poética dos trabalhos da escultora inglesa Rachel Whiteread, criando um curto-circuito. Trabalhando sobre a arquitetura de modo a negativá-la, Whiteread se apropria de edifícios em vias de demolição, preenchendo de matéria sólida (concreto ou gesso) seus espaços vazios, de modo a inverter a relação entre uso e contemplação. Solidificado, e portanto exteriorizado, o antigo espaço de vida daqueles lugares se torna impenetrável – daí a sua conotação tumular. A escultura, nesse caso, é a própria morte da arquitetura, que nela é velada silenciosamente.

rachel whiteread - ARTCLE 1

Com o desenvolvimento do capitalismo, contudo, a arte tende a deixar o espaço protegido daquela contemplação individualizada, e se voltar para as massas. Esse processo de “perda da aura” da obra de arte, tão bem descrito por Walter Benjamin, corresponde ao momento do surgimento das artes baseadas na reprodutibilidade técnica – fotografia e o cinema – , que coincide com a proliferação dos museus. Assim, a massa passa a ser a matriz de onde emanam as novas formas de percepção estética, que remodelam a acolhida da arte ao longo do século 20 em direção à percepção distraída, e não mais concentrada. Nesse processo, afirma Benjamin, a fonte de ensinamento vem sobretudo da arquitetura, arte que já lida desde a sua origem com essa forma coletiva de recepção estética: “desde o início, a arquitetura foi o protótipo de uma obra de arte cuja recepção se dá coletivamente, segundo o critério da dispersão. As leis de sua recepção são extremamente instrutivas”.

03_rachel-whiteread- ARTICLE 1

Toda arte é, em última análise, uma forma de conhecimento do mundo na qual o homem elabora materialmente a consciência de sua condição mortal, visando construir uma vida melhor. O nascimento histórico da arte junto ao mito, nos rituais paleolíticos de sepultamento e nos monumentos funerários pré-urbanos, atesta essa condição primeira da arte: a formalização consciente das distinções entre vida e morte, identidade e alteridade, existência individual e coletiva; na criação de um duplo imagético que exorciza a ideia de aniquilamento, e mantém a identidade viva em meio à transformação. Essa representação mental da vida se instala em uma brecha simbólica entre o imaginário e o real, que constitui o humano como um ser que, ao organizar mentalmente a sua existência, libera ao mesmo tempo uma energia dionisíaca, na qual o devaneio onírico e a violência são a contrapartida da racionalização. Daí que a arte não se deixe nunca racionalizar completamente, sob pena de perder o seu sentido maior.

Como forma de apelo ao outro, a arte é um conhecimento desejante do mundo que figura, por contraposição à realidade presente, o que nós gostaríamos de ser ou ter sido. Nesse sentido, funda-se filosoficamente na contradição essencial entre “ser” e o “deve ser”. O que, no caso da arquitetura, aparece no contraste entre o valor-de-uso material e um edifício (o que ele é, o seu conteúdo funcional) – isto é, p seu “ser” –, e o seu valor-de-uso ideal (sua forma, sua idealidade projetiva) – o seu “dever-se”, sua condição artística.